“Calvino é pastor zeloso e incansável no seu esforço em favor de suas muitas ovelhas, sofridas e angustiadas por males de toda sorte” Wilson Castro Ferreira
Por ocasião das comemorações dos 500 anos de aniversário de João Calvino, gostaria de refletir um pouco sobre um importante aspecto do ministério deste grande reformador. Muitos membros em nossas igrejas e principalmente nós pastores, estamos mais acostumados a pensar na figura do “Grande Reformador” como um Teólogo, do que como um pastor de almas ( embora estas duas coisas não sejam excludentes ). É indiscutível a capacidade de João Calvino como estudioso, teólogo, escritor e expositor sério da Escritura; mas há um lado de Calvino muitas vezes esquecido, o qual precisamos resgatar – seu lado pastor. E penso que olhar para a figura de Calvino nessa perspectiva pastoral, pode em muito nos ajudar hoje em nossa caminhada como pastores.
Gostaria, portanto, mesmo que de maneira condensada, olhar para Calvino nesta perspectiva, e refletir como ele desenvolveu seu pastorado nas seguintes áreas: Na pregação, na visitação e no aconselhamento. Ninguém tem dúvida, de que estas três áreas são vitais no ministério pastoral.
1) Calvino como pregador.
A pregação das Escrituras na sua totalidade, constituía o alicerce do seu trabalho pastoral. Diz ele que “A Escritura é a fonte de toda a sabedoria, e os pastores terão de extrair dela tudo o que eles expõem diante do rebanho”[1] Sua convicção é de que pela exposição da Palavra de Deus as pessoas são conduzidas à liberdade e à segurança da fé salvadora, e a verdadeira pregação, tem o objetivo de abrir a porta do reino ao ouvinte[2]. Pela pregação, a plenitude da graça de Deus alcança o coração das almas carentes.
Em suas pregações, comentários e cartas pessoais dirigidas a amigos[3], Calvino adverte os fiéis com respeito aos perigos da vida cristã, sobretudo em contato com a oposição de um mundo hostil aos valores do reino de Deus. Como pastor, Calvino também critica severamente seus oponentes teológicos e freqüentemente afirmava que “o verdadeiro pastor tem duas vozes: uma para chamar as ovelhas e outra para espantar os lobos devoradores”[4].
É óbvio que, se entendemos que a pregação da Palavra é a comunicação da graça de Deus ao coração de nossos ouvintes, nós pastores precisamos ser mais zelosos na preparação e na entrega de nossos sermões. Isto porque, não pregamos para mostrar nosso conhecimento bíblico ou capacidades de oratória, mas para que vidas sejam edificadas e transformadas. Por isto, o Pastor Calvino exorta-nos sobre o grande privilégio e responsabilidade na exposição da Palavra, considerando que “a infidelidade ou negligência de um pastor é fatal à igreja”.[5]
Seguir o exemplo de Calvino na pregação, é pregar com o propósito de produzir pessoas que reflitam a medida de maturidade de que falou o escritor de Hebreus: “Mas o alimento sólido é para os adultos, para aqueles que, pela prática, têm suas faculdades exercitadas para discernir não somente o bem, mas também o mal” Hb 5.14
Infelizmente, a pregação em nossos dias, parece ter esquecido estas verdades. Algumas pregações hodiernas contêm mais entretenimento do que ensino. Na verdade, muitos pregadores consideram o ensino doutrinário (pregação expositiva) como algo indesejável e sem utilidade prática, preferindo um sermão repleto de histórias engraçadas, revelando muito pouco do coração de Deus. Não é o tipo de pregação que as Escrituras exigem de nós.
Temos de pregar a Palavra (2 Tm 4.2); falar “o que convém à sã doutrina” (Tt 2.1). É preciso resgatar a visão do pastorado de Calvino quanto a pregação, e este é o nosso grande desafio, numa época de superficialidades e entretenimento.
2) Calvino como visitador.
Expondo a idéia de Calvino quanto à visitação, Wallace diz que se o pastor tiver uma real preocupação pastoral para com aqueles para quem ele está pregando, irá procurar não falhar em visitá-los em seus lares[6]. É explícita esta idéia em Calvino, quando ao comentar Atos 20:20, diz que Paulo estabeleceu um modelo para o ministério da Palavra quando falava sobre como ele não cessava de admoestar tanto “publicamente” quanto de “casa em casa”.[7] “O que quer que os outros pensem, não consideramos nosso cargo como algo dentro de limites tão estreitos como se, quando o sermão estiver terminado, pudéssemos descansar como se nossa tarefa tivesse terminada. Aqueles cujo sangue será requerido de nós se os perdermos por causa de nossa preguiça, devem ser cuidados muito mais de perto e de modo mais vigilante”[8]
Infelizmente essa prática vem aos poucos sendo esquecida, e mesmo aquelas igrejas que ainda valorizam a visitação, nem sempre a faz de maneira eficaz e com o propósito bíblico. Isto porque a visita para muitos, limita-se a uma conversa informal sobre muitos assuntos, acompanhada de uma xícara de café e bolinhos[9]. Contudo, há vários termos na Bíblia que mostram que a visitação pastoral é para encorajar os desanimados ( I Tes 5:11,14;), fortalecer os fracos ( Gl 6:1 ), repreender os desatentos ( 2 Tm 3:16,17 0, instruir na sã doutrina (2 Tm 4.2), etc...
Calvino tinha uma visão clara da finalidade da visita por parte dos pastores e presbíteros. Para ele, a pregação pública deve ser suplementada com visitas pastorais: “Não é suficiente que, do púlpito, um pastor ensine todas as pessoas conjuntamente, pois ele não acrescenta instrução particular de acordo com a necessidade e com as circunstâncias específicas de cada caso”[10]
É fato que o grande reformador, desenvolveu seu pastorado dispensando grande cuidado à visitação dos enfermos[11], e Ronald Wallace nos lembra que Calvino prescreveu em suas Ordenanças Eclesiásticas, que ninguém deveria permanecer três dias inteiros confinado à sua cama sem cuidar para que o ministro seja notificado e...quando qualquer pessoa desejar que o ministro vá à sua casa, deve cuidar de chamá-lo numa hora conveniente para a visita.[12]
Talvez alguém possa pensar que Calvino tinha tempo de sobra e só por isso ele conseguia fazer as visitas. Não é bem assim. Observe como Halsema fala sobre a agenda diária do Reformador:
Calvino trabalhava de uma maneira que teria esgotado qualquer homem com saúde. Estava em pé e ocupado às cinco da manhã. Se doente, ele estava na cama e ocupado, com livros espalhados sobre a colcha. Aos domingos ele pregava duas ou três vezes em Saint Pierre. Em semanas alternadas, pregava sermões na segunda, quarta e sexta-feira. Semanalmente, fazia conferências públicas na terça, quinta e sábado. Nas quintas-feiras ele também presidia a reunião do conselho da igreja, na qual todos os ministros e presbíteros se reuniam para estudar as Escrituras. Calvino assumia sua parcela de responsabilidades nas visitas aos doentes e prisioneiros. Visitava as famílias da sua paróquia com regularidade, como tivera estabelecido nas Ordens. Esses eram os deveres normais.[13]
Não tenho dúvidas de que o domingo é um dia essencial para a realização do serviço pastoral, mas Calvino adverte: “não consideramos nosso cargo como algo dentro de limites tão estreitos como se, quando o sermão estiver terminado, pudéssemos descansar como se nossa tarefa tivesse terminada”[14] Lamentavelmente, existem pastores que pensam e agem desta maneira.
Ricardo Agreste citando Eugene Peterson, deixa muito clara a idéia de que o pastor não deve limitar seu pastorado apenas aos domingos. Diz ele:
Assim, como muitos outros pastores, deparo-me com a realidade de que, apesar do Domingo ser um dia essencial no serviço pastoral, muito deste ministério precisa ser feito em meio ao caos de Segunda a Sábado ....Nossas igrejas estão necessitando de pastores que conduzam suas ovelhas através de suas limitações e crises, com amor e paciência na direção da maturidade em Cristo Jesus. Nossas comunidades precisam de guias que, através da oração e da Palavra, ajudem as pessoas a caminharem através de suas crises e a viverem em meio ao caos.[15]
Mesmo sendo um pastor muito ocupado, Calvino encontrava tempo para a visitação. Mesmo porque, visitar as ovelhas não era uma questão de ter ou não tempo, mas uma questão de visão pastoral. Visitar fazia parte da sua filosofia ministerial. Mormente, precisamos compreender que, o ministério de visitação não teve sua importância apenas nos dias de Calvino. Visitar ainda é relevante para o ministério contemporâneo, pois pela visitação, o pastor adquire direta e imediatamente conhecimento dos problemas básicos e profundos de suas ovelhas, podendo orientá-las nas Escrituras; e é pela visitação que o pastor tem como aplicar de maneira mais pessoal e direta a Palavra de Deus; bem como, pela visitação, o pastor conhece os outros membros da família que porventura não são membros da igreja, tendo assim a oportunidade de falar-lhes de Cristo.
3) Calvino como Conselheiro.
Calvino também no exercício de seu pastorado, sempre procurou encorajar pessoas sobrecarregadas, que não conseguiam encontrar consolo mediante sua própria aproximação de Deus, a procurarem seu pastor para aconselhamento particular e pessoal. Nas palavras de Ferreira, “Calvino é pastor zeloso e incansável no seu esforço em favor de suas muitas ovelhas, sofridas e angustiadas por males de toda sorte” [16].
Conforme registro de um dos seus colegas pastores em Genebra, “(...) os que lhe procuram são recebidos com simpatia, gentileza e sensibilidade. Ele os atende e prontamente lhes responde as perguntas, mesmo as mais sérias delas. Sua sabedoria é demonstrada nas entrevistas particulares tanto quanto nas conversas públicas onde ele conforta os entristecidos e encoraja os abatidos...”[17]
Como já dito, Calvino acreditava que o ensino, além de ser público nos cultos, deveria ser acompanhado por orientação pessoal e aplicado às circunstâncias específicas da vida de suas ovelhas. Atendia noivos que estavam se preparando para o casamento, pais que traziam seus problemas relacionados aos seus filhos, pessoas com dúvidas ou dificuldades doutrinárias, lutas com enfermidades, ouvia confissões de pecados, e a todos ele os recebia e levava o conforto e o encorajamento necessários[18].
Penso eu, que a razão pela qual Calvino entendia que o aconselhamento era indispensável para o trabalho pastoral, é que Deus estabeleceu a igreja como seu principal instrumento para cuidar de nossas dores e sofrimentos pessoais. Portanto, na qualidade de conselheiro, o pastor não pode deixar para a psicologia secular o cuidado de suas ovelhas, ao contrário, deve assumir esta responsabilidade e restaurar pessoas perturbadas, e orientando-as biblicamente conduzi-las à vidas plenas e produtivas para a glória de Deus.
Concluindo, penso que podemos ter Calvino como um exemplo de pastor, pois o mesmo atende à orientação que Pedro dirige ao escrever a nós pastores nos dias atuais: “Rogo, pois, aos presbíteros que há entre vós, eu, presbítero como eles, e testemunha dos sofrimentos de Cristo, e ainda co-participante da glória que há de ser revelada: pastoreai o rebanho de Deus que há entre vós, não por constrangimento, mas espontaneamente, como Deus quer; nem por sórdida ganância, mas de boa vontade; nem como dominadores dos que vos foram confiados, antes, tornando-vos modelos de rebanho. Ora, logo que o Supremo Pastor se manifestar, recebereis a imarcescível coroa da glória” (I Pe 5.1-4).
Sigamos o exemplo de Calvino. Sejamos pastores, pastores de almas.
(Texto primeiramente publicado na Revista PROPOSTA da UPH – Quarto Trimestre de 2004 )
Por ocasião das comemorações dos 500 anos de aniversário de João Calvino, gostaria de refletir um pouco sobre um importante aspecto do ministério deste grande reformador. Muitos membros em nossas igrejas e principalmente nós pastores, estamos mais acostumados a pensar na figura do “Grande Reformador” como um Teólogo, do que como um pastor de almas ( embora estas duas coisas não sejam excludentes ). É indiscutível a capacidade de João Calvino como estudioso, teólogo, escritor e expositor sério da Escritura; mas há um lado de Calvino muitas vezes esquecido, o qual precisamos resgatar – seu lado pastor. E penso que olhar para a figura de Calvino nessa perspectiva pastoral, pode em muito nos ajudar hoje em nossa caminhada como pastores.
Gostaria, portanto, mesmo que de maneira condensada, olhar para Calvino nesta perspectiva, e refletir como ele desenvolveu seu pastorado nas seguintes áreas: Na pregação, na visitação e no aconselhamento. Ninguém tem dúvida, de que estas três áreas são vitais no ministério pastoral.
1) Calvino como pregador.
A pregação das Escrituras na sua totalidade, constituía o alicerce do seu trabalho pastoral. Diz ele que “A Escritura é a fonte de toda a sabedoria, e os pastores terão de extrair dela tudo o que eles expõem diante do rebanho”[1] Sua convicção é de que pela exposição da Palavra de Deus as pessoas são conduzidas à liberdade e à segurança da fé salvadora, e a verdadeira pregação, tem o objetivo de abrir a porta do reino ao ouvinte[2]. Pela pregação, a plenitude da graça de Deus alcança o coração das almas carentes.
Em suas pregações, comentários e cartas pessoais dirigidas a amigos[3], Calvino adverte os fiéis com respeito aos perigos da vida cristã, sobretudo em contato com a oposição de um mundo hostil aos valores do reino de Deus. Como pastor, Calvino também critica severamente seus oponentes teológicos e freqüentemente afirmava que “o verdadeiro pastor tem duas vozes: uma para chamar as ovelhas e outra para espantar os lobos devoradores”[4].
É óbvio que, se entendemos que a pregação da Palavra é a comunicação da graça de Deus ao coração de nossos ouvintes, nós pastores precisamos ser mais zelosos na preparação e na entrega de nossos sermões. Isto porque, não pregamos para mostrar nosso conhecimento bíblico ou capacidades de oratória, mas para que vidas sejam edificadas e transformadas. Por isto, o Pastor Calvino exorta-nos sobre o grande privilégio e responsabilidade na exposição da Palavra, considerando que “a infidelidade ou negligência de um pastor é fatal à igreja”.[5]
Seguir o exemplo de Calvino na pregação, é pregar com o propósito de produzir pessoas que reflitam a medida de maturidade de que falou o escritor de Hebreus: “Mas o alimento sólido é para os adultos, para aqueles que, pela prática, têm suas faculdades exercitadas para discernir não somente o bem, mas também o mal” Hb 5.14
Infelizmente, a pregação em nossos dias, parece ter esquecido estas verdades. Algumas pregações hodiernas contêm mais entretenimento do que ensino. Na verdade, muitos pregadores consideram o ensino doutrinário (pregação expositiva) como algo indesejável e sem utilidade prática, preferindo um sermão repleto de histórias engraçadas, revelando muito pouco do coração de Deus. Não é o tipo de pregação que as Escrituras exigem de nós.
Temos de pregar a Palavra (2 Tm 4.2); falar “o que convém à sã doutrina” (Tt 2.1). É preciso resgatar a visão do pastorado de Calvino quanto a pregação, e este é o nosso grande desafio, numa época de superficialidades e entretenimento.
2) Calvino como visitador.
Expondo a idéia de Calvino quanto à visitação, Wallace diz que se o pastor tiver uma real preocupação pastoral para com aqueles para quem ele está pregando, irá procurar não falhar em visitá-los em seus lares[6]. É explícita esta idéia em Calvino, quando ao comentar Atos 20:20, diz que Paulo estabeleceu um modelo para o ministério da Palavra quando falava sobre como ele não cessava de admoestar tanto “publicamente” quanto de “casa em casa”.[7] “O que quer que os outros pensem, não consideramos nosso cargo como algo dentro de limites tão estreitos como se, quando o sermão estiver terminado, pudéssemos descansar como se nossa tarefa tivesse terminada. Aqueles cujo sangue será requerido de nós se os perdermos por causa de nossa preguiça, devem ser cuidados muito mais de perto e de modo mais vigilante”[8]
Infelizmente essa prática vem aos poucos sendo esquecida, e mesmo aquelas igrejas que ainda valorizam a visitação, nem sempre a faz de maneira eficaz e com o propósito bíblico. Isto porque a visita para muitos, limita-se a uma conversa informal sobre muitos assuntos, acompanhada de uma xícara de café e bolinhos[9]. Contudo, há vários termos na Bíblia que mostram que a visitação pastoral é para encorajar os desanimados ( I Tes 5:11,14;), fortalecer os fracos ( Gl 6:1 ), repreender os desatentos ( 2 Tm 3:16,17 0, instruir na sã doutrina (2 Tm 4.2), etc...
Calvino tinha uma visão clara da finalidade da visita por parte dos pastores e presbíteros. Para ele, a pregação pública deve ser suplementada com visitas pastorais: “Não é suficiente que, do púlpito, um pastor ensine todas as pessoas conjuntamente, pois ele não acrescenta instrução particular de acordo com a necessidade e com as circunstâncias específicas de cada caso”[10]
É fato que o grande reformador, desenvolveu seu pastorado dispensando grande cuidado à visitação dos enfermos[11], e Ronald Wallace nos lembra que Calvino prescreveu em suas Ordenanças Eclesiásticas, que ninguém deveria permanecer três dias inteiros confinado à sua cama sem cuidar para que o ministro seja notificado e...quando qualquer pessoa desejar que o ministro vá à sua casa, deve cuidar de chamá-lo numa hora conveniente para a visita.[12]
Talvez alguém possa pensar que Calvino tinha tempo de sobra e só por isso ele conseguia fazer as visitas. Não é bem assim. Observe como Halsema fala sobre a agenda diária do Reformador:
Calvino trabalhava de uma maneira que teria esgotado qualquer homem com saúde. Estava em pé e ocupado às cinco da manhã. Se doente, ele estava na cama e ocupado, com livros espalhados sobre a colcha. Aos domingos ele pregava duas ou três vezes em Saint Pierre. Em semanas alternadas, pregava sermões na segunda, quarta e sexta-feira. Semanalmente, fazia conferências públicas na terça, quinta e sábado. Nas quintas-feiras ele também presidia a reunião do conselho da igreja, na qual todos os ministros e presbíteros se reuniam para estudar as Escrituras. Calvino assumia sua parcela de responsabilidades nas visitas aos doentes e prisioneiros. Visitava as famílias da sua paróquia com regularidade, como tivera estabelecido nas Ordens. Esses eram os deveres normais.[13]
Não tenho dúvidas de que o domingo é um dia essencial para a realização do serviço pastoral, mas Calvino adverte: “não consideramos nosso cargo como algo dentro de limites tão estreitos como se, quando o sermão estiver terminado, pudéssemos descansar como se nossa tarefa tivesse terminada”[14] Lamentavelmente, existem pastores que pensam e agem desta maneira.
Ricardo Agreste citando Eugene Peterson, deixa muito clara a idéia de que o pastor não deve limitar seu pastorado apenas aos domingos. Diz ele:
Assim, como muitos outros pastores, deparo-me com a realidade de que, apesar do Domingo ser um dia essencial no serviço pastoral, muito deste ministério precisa ser feito em meio ao caos de Segunda a Sábado ....Nossas igrejas estão necessitando de pastores que conduzam suas ovelhas através de suas limitações e crises, com amor e paciência na direção da maturidade em Cristo Jesus. Nossas comunidades precisam de guias que, através da oração e da Palavra, ajudem as pessoas a caminharem através de suas crises e a viverem em meio ao caos.[15]
Mesmo sendo um pastor muito ocupado, Calvino encontrava tempo para a visitação. Mesmo porque, visitar as ovelhas não era uma questão de ter ou não tempo, mas uma questão de visão pastoral. Visitar fazia parte da sua filosofia ministerial. Mormente, precisamos compreender que, o ministério de visitação não teve sua importância apenas nos dias de Calvino. Visitar ainda é relevante para o ministério contemporâneo, pois pela visitação, o pastor adquire direta e imediatamente conhecimento dos problemas básicos e profundos de suas ovelhas, podendo orientá-las nas Escrituras; e é pela visitação que o pastor tem como aplicar de maneira mais pessoal e direta a Palavra de Deus; bem como, pela visitação, o pastor conhece os outros membros da família que porventura não são membros da igreja, tendo assim a oportunidade de falar-lhes de Cristo.
3) Calvino como Conselheiro.
Calvino também no exercício de seu pastorado, sempre procurou encorajar pessoas sobrecarregadas, que não conseguiam encontrar consolo mediante sua própria aproximação de Deus, a procurarem seu pastor para aconselhamento particular e pessoal. Nas palavras de Ferreira, “Calvino é pastor zeloso e incansável no seu esforço em favor de suas muitas ovelhas, sofridas e angustiadas por males de toda sorte” [16].
Conforme registro de um dos seus colegas pastores em Genebra, “(...) os que lhe procuram são recebidos com simpatia, gentileza e sensibilidade. Ele os atende e prontamente lhes responde as perguntas, mesmo as mais sérias delas. Sua sabedoria é demonstrada nas entrevistas particulares tanto quanto nas conversas públicas onde ele conforta os entristecidos e encoraja os abatidos...”[17]
Como já dito, Calvino acreditava que o ensino, além de ser público nos cultos, deveria ser acompanhado por orientação pessoal e aplicado às circunstâncias específicas da vida de suas ovelhas. Atendia noivos que estavam se preparando para o casamento, pais que traziam seus problemas relacionados aos seus filhos, pessoas com dúvidas ou dificuldades doutrinárias, lutas com enfermidades, ouvia confissões de pecados, e a todos ele os recebia e levava o conforto e o encorajamento necessários[18].
Penso eu, que a razão pela qual Calvino entendia que o aconselhamento era indispensável para o trabalho pastoral, é que Deus estabeleceu a igreja como seu principal instrumento para cuidar de nossas dores e sofrimentos pessoais. Portanto, na qualidade de conselheiro, o pastor não pode deixar para a psicologia secular o cuidado de suas ovelhas, ao contrário, deve assumir esta responsabilidade e restaurar pessoas perturbadas, e orientando-as biblicamente conduzi-las à vidas plenas e produtivas para a glória de Deus.
Concluindo, penso que podemos ter Calvino como um exemplo de pastor, pois o mesmo atende à orientação que Pedro dirige ao escrever a nós pastores nos dias atuais: “Rogo, pois, aos presbíteros que há entre vós, eu, presbítero como eles, e testemunha dos sofrimentos de Cristo, e ainda co-participante da glória que há de ser revelada: pastoreai o rebanho de Deus que há entre vós, não por constrangimento, mas espontaneamente, como Deus quer; nem por sórdida ganância, mas de boa vontade; nem como dominadores dos que vos foram confiados, antes, tornando-vos modelos de rebanho. Ora, logo que o Supremo Pastor se manifestar, recebereis a imarcescível coroa da glória” (I Pe 5.1-4).
Sigamos o exemplo de Calvino. Sejamos pastores, pastores de almas.
(Texto primeiramente publicado na Revista PROPOSTA da UPH – Quarto Trimestre de 2004 )
Rev. Gildásio Reis, Pastor da Igreja Presbiteriana de Osasco, formado em psicanálise clínica, Mestre em Teologia pelo centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper (Educação Cristã), Mestrando em Ciência das Religiões pela Universidade Mackenzie, e Professor de Teologia Pastoral no Seminário Presbiteriano “Rev. José Manoel da Conceição”.
[1] João Calvino, As Pastorais, Comentário em I Tm 4:13, p. 123
[2] VALLACE, Ronald. Calvino, Genebra e a Reforma. São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã. 2004 p. 145
[3] Calvino tinha muitos amigos, ebtre eles Viret e Fare, e as cartas escritas a estes dois homens superam em número aquelas dirigidas a qualquer outra pessoa. A Viret escreveu ele mais de 60 cartas e a Farel mais de 90. Através destas cartas é possível conhecer muito o coração pastoral de Calvino. Cf. Ferreira, p. 155
[4] Wallace, Op Cit., p. 144
[5] João Calvino, As Pastorais,( comentário em I Tm 4:16 ), p. 126
[6] VALLACE, Op Cit., p. 147
[7] Calvin, John. Calvin´s Commentaries – The Acts Of The Apostles. Vol. II. Grand Rapids, Michigan: Eerdmans Publishins Company. 1973 p. 175
[8] Wallace, Op Cit., p. 147
[9] SITTEMA, John. Coração de Pastor – Resgatando a Responsabilidade Pastoral do Presbítero. São Paulo, SP: Ed. Cultura Cristã. 2004 p. 198
[10] Calvin, John. Calvin´s Commentaries – The Epistles Of Paul – The Apostle To The Romans And To The Thessalonians. Grand Rapids, Michigan: Eerdmans Publishins Company. p. 345 ( Ao camentar I Tessalonissenses 2:11, Calvino insiste em que o pastor precisa ser um “pai” para cada pessoa.
[11] LESSA, Vicente Tenudo. Calvino -1509-1564 – Sua Vida e a Sua Obra. São Paulo, SP: Casa Editora Presbiteriana. P. 119
[12] Wallace. Op Cit., p. 148
[13] HALSEMA, Thea B. Van. João Calvino Era Assim. São Paulo, SP: ED. Vida Evangélica. 1968. p. 139
[14] Wallace, Op Cit., p 147
[15] http://www.editorasepal.com.br/sepal/jornal/out_dez2001/pastorear.htm ( capturado em 22/03/04 )
[16] Ferreira, Wilson Castro. Calvino: Vida, Influência e Teologia. Campinas, SP: LPC. 1985. p. 153.
[17] Palavras de Nicolas des Gallars registradas por Richardr Staufer em The Humanness of John Calvin (New York: Abingdon Press, 1971) e citadas por Baumann.
[18] Calvino, João. As Institutas da Religião Cristã. Vol. IV, 3: 6 - São Paulo, SP: Casa Editora Presbiteriana. 1989.
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